Músicos Gospel, eleições e “showmícios”

Vergonha para o evangelho, vergonha para o nome de Cristo, vergonha para a igreja, exposição do que não somos, do que não cremos, diante dos incrédulos e da sociedade de um modo geral! Vimos os desmandos, equívocos, discursos, canções e imagem de artistas e grupos “chamados” cristãos ou gospel, que canalizaram apoio a determinados candidatos ou permitiram seus eventos serem transformados em palanques, e como se fosse “em nome do Senhor”, o que é mais grave!
Músicos que se apresentaram em comícios (recompensados com polpudos cachês), shows de música gospel que se transformaram em “plataformas”, irmãos que foram usados como massa de manobra, cantores usando textos bíblicos absolutamente distorcidos, algumas marchas para Jesus (o que Ele teve a ver com várias delas?) repletos de santinhos e propaganda de candidatos chamados evangélicos e palavras do palco, que chegavam “de surpresa” (faz de conta que ninguém sabia né?).
Cheguei no Nordeste e vi, indignado, um pequeno flash de um show na televisão de vários cantores que mais vendem CDs, sendo usados em horário político, aproveitando do microfone e falando o famoso provérbio “quando o justo governa blá, blá, blá, blá………….” Artistas falando de gente ou candidatos que jamais viram ou conheceram, candidatos que os trouxeram, para enganosamente “pregar e conduzir o povo à adoração” e usarem irresponsavelmente a Palavra de Deus e o nome do Senhor com “unção”. Faltaram falar também na “pregação” do que acontecerá com aqueles que proferem mentiras ou enganam os santos e o povo com seus lábios. Enfim, tudo muito triste e caótico.
Mas, afinal, o que se pode se esperar mesmo dos que propiciaram estes escandalosos desvirtuamentos? O que esperar de líderes, gravadoras ou máquinas de marketing de quem já ouvimos e a respeito de quem lemos no passado em declarações na imprensa, que “todo musico evangélico tem seu preço e um ego a lustrar”? Afinal todos querem fama e sucesso!
Que os músicos cristãos sérios e líderes de adoração com ministérios reconhecidos se manifestem!
Você caro leitor, também tem visto e ouvido estas coisas nestes últimos tempos, em seu canal de TV, em sua rádio preferida, em sua cidade e talvez em sua própria igreja. Não há como escapar, já que estamos inseridos e envolvidos neste contexto, mas temos que nos posicionar sobre isto. Nossa omissão pode nos deixar prisioneiros, sem voz e vez e trazer mais prejuízos ao evangelho, aos nossos filhos, aos que precisam ver coerência em nossas vidas com o evangelho de Jesus que pregamos e cantamos.
Sou obrigado tristemente a concordar, convivendo há mais de 30 anos neste meio da música: muitos vendem a fé, a consciência, a ética, o caráter, a alma e, se pagarem bem, até a própria mãe, sem qualquer crise de consciência. Só temos que discutir os “valores” com os empresários. Afinal, dizem alguns músicos, somos “profissionais”. E eu pergunto: profissionais de que e a serviço de quem? Hoje somos um mercado em expansão (gloriar-se nisso é o que temos que fazer?) Já até celebramos este “nosso sucesso” em feiras e congressos. Comércio é lugar de viver também o Seu senhorio em relações justas, honestas e éticas. É possível também viver da música e ter um sustento digno e relações mais justas com aqueles que consomem sua arte e música (público consumidor e igrejas). Reconhecer e remunerar os que seriamente se dedicam e vivem da arte é igualmente justo! Mas hoje, os parâmetros são díspares, não são comuns, cada cabeça uma sentença e pronto. Não amadurecemos nesta área.
Neste período eleitoral músicos se uniram também a pastores e líderes que, ao contrário de orientarem o rebanho em suas cidades e abrirem um espaço democrático para que pudéssemos examinar as propostas, experiência e vida dedicada à causa pública e promoção humana de cada candidato, simplesmente usufruíram do chamado voto de cabresto e impuseram, com sentimento de culpa sobre as humildes ovelhas, o peso de que trairíam a fé ou à igreja se “não votassem em irmão”, se não votassem nos candidatos indicados e dirigidos “por Deus”. E continuamos usando Seu nome em vão, à procura de benesses e benefícios! Porém, nada de novo debaixo do sol! E, lamentavelmente, pouca ou nenhuma diferença entre luz e trevas!
Que não nos enganemos! O juízo não tarda e não podemos escapar dele (vou prestar contas também dos meus atos e preciso cuidar, corrigir, profetizar em minha vida, casa e contexto). Teremos um justo Advogado. Aguardemos todos, juízo que será para todos, justos e injustos. “Everybodes”, falsos profetas e joio gospel, vão sim, prestar contas diante de um reto e justo Juiz sobre atos, palavras, mentiras e enganos.
Aos tolos e ingênuos, que continuem prestando um desserviço ao Reino, trazendo os “artistas” chamados cristãos, pagando seus abusivos cachês irracionais para as realidades de nosso sofrido país, hospedando-os em hotéis 7 estrelas, com água mineral da marca tal, toalhas extras e frutas especiais. Que, distantes cada vez mais do povo, continuem alimentando os egos de seus astros de limitada e discutível capacidade artística, refletindo uma geração de artistas que podem vender CDs e trazer público para seus eventos, mas não trazem mais referencial de temor a Deus, compromisso com a Palavra e com o discipulado, influenciando negativamente nossos filhos e jovens, músicos que tem cantado e pregado um evangelho estranho, distorcido, dilacerado, falso, comprometidos com Mamom e próprio ventre somente, e com o deus Narciso.
E choremos e lamentemos os estragos futuros na vida, coração e alma de muitos nesta geração, inclusive alguns dos seus, caros leitores, que não desejarão mais seguir a Cristo ou viver na comunidade que ele fundou para cumprir a missão de testemunhar, pregar, fazer discípulos que obedecem seus mandamentos. Não preciso ser profeta para prever isto. É a constatação de quem caminha por este país o ano todo. Isto já está acontecendo e o número destes desastres tem aumentado em muito. Que confirmem isto pais, pastores e psicólogos cristãos que estão tentando recuperar os traumatizados!!!
Perdoem e acolham minha indignação inicial. Tenho certeza que ela não é só minha. Mas é o primeiro sentimento que chega em meu coração, ao ver e ouvir tanta barbaridade destes últimos meses pré-eleitorais, no rádio e TV, do que foi feito nestas últimas eleições em nosso meio e com os músicos e artistas cristãos. Como evangélicos extrapolamos em muito, ultrapassamos muitos limites, brincamos com a liberdade que temos, plantamos e colheremos. Junte-se a isso, as matérias de grandes periódicos de circulação nacional falando de nossa “fé tipo exportação” ou avaliando nossa conduta e movimento missionário, expondo nossas incoerências e doenças instaladas. Líderes que fazem do marketing puro e simples uma ferramenta mais forte do que a própria Palavra de Deus. Que pouco falam do encarnar-se, esvaziar-se da glória, estrebaria, manjedoura, vida em simplicidade, vida de amor e justiça, doação pessoal, morte de cruz, discípulos e apóstolos que morreram por amor. Afinal, dá pouco Ibope… que marketing estranho seria esse?
O segundo sentimento é de tristeza e impotência, ao ver como temos nos distanciado da verdade e Daquele que é a Verdade. Daquele que não usa, não engana as pessoas ou mente, que respeita a mim e a você, que nos trata sem preconceito e com dignidade, que é justo, digno, bom, santo! Que continua com Seu Espírito transformando nossas intenções do coração e caráter. Deus que não tem sido anunciado como convém e com o testemunho das Escrituras Sagradas!
Mas, estranhamento, o terceiro sentimento que me vem é de esperança, por saber que Deus zela pelo seu nome, por Sua obra e vai fazer o nome de Jesus ser conhecido em todas as nações. Que é possível usar a música e a arte sem subterfúgios ou com motivações desonestas. Deus que tem sido paciente em toda a história do homem e da igreja, misericordioso, no tempo certo, no kairós e no kronos, colocará em ordem Sua casa e a Sua criação. Meu desafio pessoal é continuar tentando viver debaixo de Seu reinado, resistir às tentações do meio musical e continuar nesta peregrina jornada junto com tantos outros que estão abençoando o povo de Deus com suas vidas, canções e ministérios musicais.
Continuo com a convicção que Deus prioritariamente não está nem um pouco interessado se vou fazer sucesso, ser conhecido ou vender muitas cópias do CD ou livro que escrevo, mas sim interessado em fazer o nome, o evangelho transformador e a Pessoa de Jesus Cristo, ser conhecida e obedecida em todas as nações! Se o que fizer contribuir para este propósito, vendendo 10 ou 100 mil, Ele é que sabe e o fará para a sua glória. Afinal, os artistas, adoradores, filhos, santos e eleitos, foram eleitos para isto mesmo: manifestar a Sua glória! Que busquemos coerência com temor e tremor!
Nelson Bomilcar
(É pastor, compositor e músico, e tem trabalhado na adoração e música cristã nos últimos 30 anos, ministrando e pastoreando músicos, tendo produzido inúmeros cantores e grupos no Brasil. Participou de Vencedores, Semente, IBMorumbi. É membro da Associação de Músicos Cristãos (AMC) do Brasil.)